sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

A HORA DA CHEGADA

As malas já estavam no carro quando ele apareceu, de longe observava-se o quanto estavam cheias. Roupas, calçados, utensílios domésticos, produtos de beleza e aparelhos eletrônicos. Em uma viagem daquela nada disso poderia faltar. Que ser - humano poderia viver sem a famosa tecnologia? Tecnologia presente na música, na dança, na criança, na vida. Era um simples funcionário público, cursara até a oitava série. Mas em sua simples casa tinha um simples televisor de vinte e nove polegadas, um simples aparelho de som de 1200 watts, além do Vectra 2009 simples na garagem. Seus filhos nunca brincaram na rua, viviam cercados de brinquedos eletrônicos. Carrinhos elétricos, bonecas falantes, plastatyon, computador. O sonho que todo pai tem, dar ao filho tudo aquilo que ele não pode ter. Depois de tudo pronto resolveu seguir adiante, todos entraram no carro e pé na estrada. A viagem era longa, não via a hora de chegar. As árvores secas, os cavalos marchando, as estradas de terra, os morros, as ruas feitas com pequenas partículas de pedras. Em sua mente já se formava a imagem da parentela. Avós, tios, primos, amigos. O simples sonho de retornar ao lugar da infância estava prestes a se realizar. As lágrimas entrelaçavam-se nas pupilas de seus olhos, o brilho castanho de sua lente negra transparente começava a acender as chamas da saudade. Saudade que serrava seu coração semelhante a uma serra nas mãos do jardineiro ao podar o galho de uma palmeira. Entretanto estava convicto de que tudo passaria depois de chegar à terra prometida. Já conseguia ver as pequeninas casas no terreiro do roçado. As paredes descascadas pelas marcas do tempo. Paredes construídas com aroeira e barro na época da fartura. Janelas de madeira e prego modeladas pelo pai. Portas minúsculas com abertura na parte superior e inferior, repletas de pregos e tramelas. Tetos de galhos desenquadrados de telhas antigas. Ao anoitecer as lamparinas de querosene nas mesas e janelas. Na estante da sala um velho rádio sintonizado na rádio da rádio da cidade. Ligações de São Paulo, Rio de Janeiro aos parentes inesquecidos. Os filhos nunca poderiam entender o brilho daqueles olhos, o porquê daquela vontade insaciável de retornar à infância. Nunca entenderiam os momentos vividos, as aventuras passadas, várias queixas queixadas, várias surras tomadas. Não entenderiam todo tempo perdido, a perda dos amigos, a saudade dos antigos. Não entenderiam, nunca entenderiam...
Na via ouvia-se o som do asfalto. O vento batendo nos pára-brisas, as rodas correndo nas pistas, as árvores passando nas vistas. Com o tempo o passeio tornava-se cansativo, as pernas cansadas, paradas, dobradas inchavam nos bancos cinzentos do carro não lento correndo ao alvo. As horas passavam, o corpo acostumava e a viagem finalizava. Nos vidros ouvia-se o som dos córregos, viam-se os morros verdes e as rochas rachadas rochosas roxas. O ar mudava, as usinas de açúcar afastavam e as areias brancas aproximavam-se. Os vendedores de frutas típicas invadiam as estradas oferecendo pacotes das mais várias variedades para os clientes cientes de que estavam prestes a chegar. Os imbuzeiros apareciam nas encostas dos barrancos, os juazeiros já estavam com as folhas verdes, de longe se via as longas plantações de feijão e algodão. Estava chegando. As mulheres carregavam longas trouxas de roupas na cabeça para lavar nos lajedos, as crianças corriam nuas ao redor das velhas casinhas. Estava chegando. Os vaqueiros, com o chapéu de couro, cavalgavam pelas capoeiras. Os cidadãos da roça saiam com suas enxadas de pau de aroeira. Estava chegando. As barracas na feira já começavam a ser arrumadas. Estava chegando. A simpatia do povo do nordeste era visível. Estava Chegando. O coração começava a disparar. Estava chegando. Ele estava feliz, afinal estava chegando.




                                                                                          (Jucinei R. Santos - 2011)